Os moradores das quebradas de Guayaquil têm horário para voltar para casa
Os moradores das "ciudadelas" de Guayaquil, comunidades situadas em bairros pobres, vivem sob o controle dos traficantes. Essas comunidades enfrentam um horário limite imposto pelos criminosos, sendo obrigados a recolher-se em suas casas antes das 19h. Quem desobedecer essa regra corre o risco de passar a noite nas ruas, em meio a um ambiente violento e perigoso.
Essa imposição de horário foi estabelecida pelos próprios moradores entre 2010 e 2020, em uma tentativa de combater o aumento dos roubos na região. Apesar das ordens da prefeitura para remover os portões instalados, eles permaneceram e agora são usados pelos traficantes como uma forma de controlar a entrada e saída das comunidades. Quando ocorre um crime grave ou a morte de algum rival, os traficantes trancam os portões, deixando os moradores aprisionados em seus bairros.
A situação é ainda mais grave nas regiões estratégicas, como Durán, que serve como armazém para as drogas, e Guasmo e Isla Trinitaria, próximas ao porto, de onde partem embarcações com cargas de cocaína. Os traficantes usam um método conhecido como "gancho cego", onde a droga é escondida nas embarcações para ser recolhida posteriormente por comparsas em destinos como Europa e Estados Unidos.
A atuação dessas quadrilhas é marcada por extrema violência e ameaças, com a utilização de armas pesadas, decapitações e esquartejamentos. Comerciantes e moradores são extorquidos para financiar o combate entre os grupos criminosos. Em 2022, quatro crianças foram assassinadas em Guasmo como parte de um acerto de contas. O medo é uma constante nessas comunidades, fazendo com que as ruas fiquem desertas durante a maior parte do dia.
Até os moradores mais abastados da cidade, como Doris Polo e seu marido Jayme Cabrera, vivem de forma reclusa, com medo de sequestros. Eles optaram por investir em um carro blindado para se proteger, assim como seus vizinhos ricos. No entanto, muitos enfrentam dificuldades para adquirir esses veículos à prova de balas.
O clima de violência e impunidade tem levado a uma aceitação cada vez maior da população em relação a qualquer tipo de enfrentamento contra os criminosos, mesmo que envolva tortura e agressões físicas. Grupos em redes sociais compartilham vídeos de militares agredindo e humilhando suspeitos de crimes, e essas publicações são amplamente curtidas e aprovadas. Há até mesmo manifestações de xenofobia contra venezuelanos e colombianos, culpando-os pelo caos na cidade.
A situação é tão alarmante que a própria polícia enfrenta tiroteios diários nas áreas afetadas pelo tráfico de drogas. Nataly Orna, subtenente da polícia, relata o seu trabalho em combater esses crimes e ressalta a necessidade de enfrentar o medo de morrer para cumprir seu dever de proteger a população.
Em uma sociedade dominada pelo crime e pela violência, as comunidades de Guayaquil vivem sob constante ameaça e limitações à sua liberdade. A adoção de medidas de segurança, como o fechamento de portões e a aquisição de carros blindados, torna-se uma realidade para todos, independentemente de sua classe social, em busca de proteção e sobrevivência.
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